A coragem de Celina Leão nos esportes do DF em plena pandemia
O desafio de trocar o cargo de deputada distrital e assumir a Secretaria de Esporte do DF fez de Celina ainda mais forte. Era preciso peito de remador e pernas de jogador de futebol para contribuir para a saúde física e mental num cenário onde tudo estava silencioso e, a vida, cibernética. Desafio alcançado. Parques que reabriram aos poucos sob a supervisão de voluntários de Educação Física, cadastrados no Órgão; depois, as academias. Daqui para frente, as perspectivas são as melhores, principalmente em relação à inclusão social e esporte para todos.
Por Carolina Cascão
É educado tirar o excesso de areia da bola antes de sacar ao adversário no futevôlei. Não é regra. Após fazer o “vulcãozinho” de areia e posicionar para chutar, o outro atleta pode usar a parte do corpo que quiser para receber a bola, menos a mão e o braço. Celina Leão, recente Secretária de Esporte do Distrito Federal, e também praticante dessa modalidade de esporte, usou o peito e a coragem para assumir o cargo no auge da pandemia. Simbolicamente, as mãos e os braços não teriam mesmo vez neste caso. O desafio foi mesmo não esmorecer, mesmo que grãos de areia viessem do outro lado da rede. E tudo tem dado certo, as noites mal dormidas cederam espaço, desdobraram as redes. Não mais adiante, o apito do árbitro agora será apenas para declarar que o jogo começou e que o esporte em Brasília tem todas as ferramentas para um futuro glorioso.
“Foi um desafio em plena pandemia”, disse. Celina disse que as pessoas perguntavam “o que você vai fazer lá?”. “O momento era de muita dificuldade. Achei que se assumisse esse cargo num período tão difícil e fizesse a diferença, as pessoas iriam entender que eu tenho condições de fazer um bom trabalho na Secretaria de Esporte. Isso me motivou a sair do meu mandato de deputada. O apoio dos eleitores foi importante também. Eles me impulsionaram e falaram para seguir o meu perfil de mulher corajosa. Sempre fui assim”, disse.
E o cenário era mesmo turbulento, ou pior, silencioso. Toda a população estava confinada em casa e todos os parques, assim como o comércio, estavam fechados. O primeiro ato da Secretaria foi dar o pontapé inicial, ao lado do Governador de Brasília, Ibaneis Rocha, para retornar as atividades esportivas no DF. “O cenário era de depressão e de melancolia. Já eram 90 dias com as pessoas dentro de casa. As famílias estavam confinadas. Muitas com problemas financeiros também. Até as pessoas que têm boas condições e estavam confinadas por tanto tempo, estavam abaladas. A saúde da nossa sociedade estava ameaçada”, explicou.
Dentre as primeiras ações foi a do Governado Ibaneis em reconhecer o educador físico como profissional da saúde. E depois, a abertura dos parques. Celina explica que por questão de saúde e não por lazer e recreação, a decisão de parques voltarem a funcionar era certa. Para que isso fosse possível, a Secretaria contou com a ajuda de 400 voluntários da área de Educação física que foram treinados virtualmente. Eles foram distribuídos por unidades de parque, vinculadas a Secretaria do Esporte, a Administrações Regionais e do Instituto Brasiliense de Meio Ambiente. O trabalho diário de quatro horas dos voluntários, além de distribuir máscaras e álcool em gel, era o de conscientizar as pessoas sobre não aglomerar e orientar nos exercícios já que estavam paradas há um tempo. Eles tiveram também o apoio do Corpo de Bombeiros caso alguém se sentisse mal. E foram treinados pela Secretaria de Saúde para entender o que é o vírus covid. “Quando acabou o programa, eles não queriam parar. Muitos nos ajudaram além das quatro horas. Eles não eram apenas voluntários eram pessoas muito próximas de nós. Emitimos um certificado e todos agora têm o registro de um momento histórico das nossas vidas”, revela.
“Foi uma operação cirúrgica. E fomos medindo para ver o que isso impactou na curva do Covid. Foi um impacto positivo ou negativo? Não tivemos impacto negativo. Pelo contrário, as pessoas resgataram a saúde mental e física. E isso melhora a imunidade, um fator que combate o vírus”, disse.
“Não podemos desprezar o covid, mas temos que enfrentá-lo”.
Na semana seguinte, ao perceber que os parques estavam atraindo muita gente, a Secretaria de Esportes decidiu ampliar os espaços ao abrir algumas quadras da w3 sul do Plano Piloto, aos domingos, especificamente para a prática de exercícios, como também as ruas de lazer nas regiões administrativas, a começar pelo Paranoá.
O momento que enfrentou mais dificuldade, de acordo com Celina, foi a abertura das academias. “Existe medo, mas a academia é um lugar de saúde. Temos a pesquisas de que se seguirem os nossos protocolos, ela se tornará mais segura que uma ida ao mercado”, disse.
O esporte não pode parar por questões de formação também. “O esporte torna você um cidadão melhor. O cidadão que não desiste e que tem força de vontade diferenciada. Em regiões mais carentes, o esporte disciplina a pessoa e a prepara para o futuro”, disse.
Perspectivas de futuro
As ações com objetivos futuros já começaram: a A Secretaria de Esporte está buscando recursos junto à Câmara Federal e Distrital. “Estamos sensibilizando os deputados com a certeza de que estamos buscando ferramentas poderosas para o próximo ano com investimentos ao esporte da cidade”, disse.
Celina Leão está muito empenhada. “Conseguimos algo inédito: estamos utilizando fundo de apoio ao esporte que têm patrocinado algumas ações, como a distribuição de material esportivo a regiões administrativas e reformas de nossas vilas olímpicas. Era uma destinação do próprio fundo, mas que ele não utilizava”, revela.
Segundo a Secretária, a gestão que tem sido realizada com os conselheiros e a equipe técnica é satisfatória. “Teremos parceria com o Sesi (Serviço Social da Indústria) que oferecerá 2 mil vagas para alunos da rede pública. No Sesi de Taguatinga não tem vila olímpica. E no Sesi de Sobradinho não tem parque aquática. Então, estamos economizando recurso público e atendendo regiões que não eram atendidas antes. Ao invés de construir novas vilas olímpicas, estamos aproveitando espaços como o do Sesi”, disse.
“Estamos reformando nossos centros olímpicos e comprando material esportivo. Quantas vezes já se viu um projeto interessante de alguém, mas que estava parado por falta de material?”, finalizou.
“Fizemos várias intervenções no Parque da Cidade. Começamos a reformar quadra de areia. Colocamos luz led nas quadras. Reformamos dois vestiários que ficam prontos na próxima semana. Estes dois ambientes nunca viram uma reforma desde que foram construídos. A pessoa vai poder correr no parque e depois tomar um banho de chuveiro. Bem agradável”, disse. Além disso, licitaram 27 quadras para reformar. “Tem muita coisa acontecendo ao mesmo tempo. Com o orçamento que peguei, saí correndo atrás”, revelou.
Por meio de um convênio com o Governo Federal, a Secretaria de Esportes lançara um programa que vai disponibilizar profissionais de Educação Física e técnicos desportistas para os parques das regiões administrativas. “Essas pessoas vão dar uma hora de aula nos parques… uma ginástica laboral na praça de Taguatinga. A Secretaria que fará a gestão de onde será a distribuição do serviço desses profissionais. Acho que esse vai ser um grande projeto pois as pessoas vão perceber o valor do esporte”, disse.
Autódromo de Brasília voltará a funcionar via GDF ou via parceria público-privado?
“Esse processo está na Terracap que deve fazer uma licitação para que o problema seja resolvido. O que a população de Brasília quer ver é o autódromo funcionando e sem provocar prejuízo ao Estado. Na última reunião que fizemos, a Terracap está terminando o estudo e a análise de como o problema será resolvido definitivamente. O que estava na minha gestão é o kart: consegui um alvará provisório para deixar quem estava lá, continuar fazendo as corridas e cobrei uma taxa de uso. Conseguimos agora lançar a licitação pela Secretaria”, disse.
Existe assédio por falta de decoro por falta dos colegas do Congresso? Ou mesmo o assédio do eleitor?
Celina respondeu que é bem resolvida em relação ao assunto até porque os colegas a conhecem e sabem da firmeza dela. Para ela, a forma de se portar faz dessas situações uma brincadeira, um fato corriqueiro. “Acabo me tornando amiga depois. Sempre construí com a minha vida pública”, riu.
“Você trabalha tanto e se porta tão parecida com eles que o encanto acaba”, riu. “Acabamos ficando tão homens quanto eles”, emenda.
“O eleitor é muito carinhoso. Pede até em casamento. O eleitor sabe que é uma brincadeira”, disse. Celina, inclusive, lembra-se de uma enquete, realizada por meio de uma rede social dela, com a pergunta “o que você faria se fosse a deputada Celina Leão por um dia?”. Ela disse que um homem chamado Zézinho respondeu: “largaria o meu marido e daria uma chance ao Zézinho”. “É claro que foi uma brincadeira. Foi criativo e engraçado”, disse.
Sobre a dificuldade de um juiz condenar um estupro culposo
“Essa foi uma das maiores aberrações jurídicas que já vi. Sou presidente da Frente Parlamentar de Direito das Mulheres na Câmara Federal. Percebo que todos os avanços que as mulheres tiveram e foram muitos até porque poucos anos atrás, a mulher era propriedade do marido, não tinha direito civil nem direito a voto. Então tudo que conquistamos foi através de muita luta. E até hoje vemos comportamento neste formato. Temos isso, às vezes, até na Câmara com deputados machistas que querem a cota das mulheres dos 30% de uso do fundo partidário”, disse,
“A cota que veio para financiar a campanha das mulheres fez com que dobrasse o número de mulheres dobrasse na Câmara Federal. Um momento ímpar no Brasil foi no Supremo quando tivemos a Rosa Weber no Tribunal Superior Eleitoral e uma mulher na frente da Procuradoria Geral da República. Isso facilitou que além dos 30% de vaga, tivéssemos os 30% de dinheiro”, explicou.
Ela revelou que muitos homens na época fizeram projeto para acabar com a cota. “Foi um avanço para nós. Se não nos posicionássemos, iríamos retroceder. Imagine: pegue os grandes partidos políticos e me diz quais são os que têm mulher comandando? Nunca tivemos uma mulher na presidência da Câmara Federal. Então, a mulher ainda está buscando um espaço de conquista”, disse.
As conquistas, de acordo com Celina, não são nem de direita nem de esquerda. “Conheço mulheres maravilhosas que tinham pensamento de esquerda e lutaram pelas mulheres. E de mulheres de direita que lutaram também pelas mulheres. Isso é uma pauta que é nossa. Foi uma honra participar da Frente Parlamentar das mulheres. Tem muita pauta que nos divide. Mas as pautas que são relacionadas à mulher, nos une, como direito à creche, direito à amamentação. Aí não existe nem direita nem esquerda”, afirmou.

Quem é Celina?
Celina Leão nasceu em Goiânia (GO) em 02/03/1977. É formada em administração e psicologia. E no momento está cursando o curso de direito. Ela terminou a entrevista com mensagens de fé e esperança em meio à pandemia e pediu para que pratiquem esportes.