Por Natasha Dal Molin
A frase é retirada do romance Cabra-cega, de 2021, da escritora mineira Gracia Cantanhede. Mineira, não,“brasiliense de Minas Gerais”. “Brasília é a minha Passágarda. Aqui realizei muitos sonhos. Escolhi Brasília para, aqui, viver e morrer”, conta a jurista e escritora, que ocupa a cadeira de número 23 da Academia de Letras de Brasília,
Apaixonada pela cidade, Gracia é frequentadora assídua de restaurantes, livrarias, cinemas e espetáculos teatrais da cidade. É possível se esbarrar com ela pelo do Pontão do Lago Sul e pelas feiras que reúnem pessoas de culturas diferentes, afinal, como boa escritora e observadora, ela gosta, sobretudo, de gente.
A paixão pelo universo das palavras
O gosto pela leitura chegou cedo, ainda na infância. Suas lembranças remontam às memórias das boashistórias contadas pelos pais e tios. “Eu amava ouvir os casos verdadeiros ou inventados”, recorda Gracia, que mesmo antes de saber ler tinha interesse em folhear livros.
Aos 11 anos, tinha as redações elogiadas pelos professores e já alardeava que seria escritora. Muito curiosa e sonhadora, lia muito e aprendeu desde cedo a ver e se encantar pela mágica do mundo das palavras. E foi nesse universo em que ela se escondia e se revelava ao mesmo tempo que ela encontrou refúgio, construiu um universo particular só dela, principalmente na adolescência.
Família
Com uma visão otimista e alegre, Gracia não foge ao seu lado “mãe de família”. Além de ser exímia escritora, ela é extremamente cuidadosa e exigente com os afazeres de casa, e conta que sempre teve e tem o estímulo do marido, um intelectual, para se dedicar à escrita. Em sua casa, ambos possuem mais de 25 mil livros. “Tudo conspirou a meu favor. Me considero uma pessoa de sorte”, pontua, agradecida.
Os desafios de ser mulher
Mesmo com esse olhar de gratidão, Gracia reconhece que o fato de ser mulher tem muitos desafios. “Ser mulher, em qualquer tempo, sempre foi difícil. Todas as nossas conquistas passaram por um processo longo de lutas. Se o preconceito e o machismo existem até hoje, imagine nas décadas passadas”, ressalta.
Na própria vida, teve que, ao longo dos anos, ceder o espaço da escrita para cuidar dos filhos, da casa e trabalhar fora. Por décadas, Gracia atuou como Procuradora Geral da Advocacia Geral da União. “É a tríplice jornada de trabalho que a maioria das mulheres tem. Escrevia quando sobrava tempo, mas nunca deixei de escrever”. E por acreditar no próprio sonho, ela carrega consigo a mensagem, que procura fazer reverberar, aos mais jovens: “Não desperdicem as oportunidades”.
Sim, Gracia reconhece que saber identificar e aproveitar todas as oportunidades que a vida lhe deu, a ajudaram a realizar os sonhos e vontades do coração. Para ela, não se pode perder a chance, citando a velha história do cavalo que passa arriado, que não passa duas vezes. Para ela, o dito é muito verdadeiro e nos serve de recomendação para estarmos atentos e preparados para as oportunidades da vida.
Fã de escritores brasileiros como Jorge Amado, Graciliano Ramos, Drummond, Cecília Meirelles, ela também aprecia os clássicos Tostói, Dostoiévski, Gógol, Toni Morrison, Scott Fitzgerald, Virginia Woolf, Galeano, dentre tantos outros.
Novos projetos
Para o ano de 2023, Gracia tem a intenção de publicar um livro de contos e um de poesia e também quer voltar a escrever com mais disciplina. O processo de escrita, no entanto, pode ser de um fôlego só ou demorar um pouco mais. “O processo da escrita é sempre um milagre, uma surpresa ou um prêmio”, pontua. As vezes é necessário escrever e reescrever várias vezes. E mesmo tendo dificuldade com textos longos, a escritora já fez nascer 3 romances.
Sonhos para Brasília
Para Brasília, sua terra escolhida, ela reserva uma boa ponta de esperança, apesar das dificuldades e dos muitos desafios. “Penso que daqui 50 anos teremos uma cidade mais humanizada, com o transporte público satisfatório, com atendimento hospitalar sem filas, com as crianças em boas creches e melhor assistência aos idosos”. Para isso, ela aponta a necessidade de melhoraria das escolas públicas e o combate à desigualdade social.
Obrigada, Natasha e Édson. Amei o texto.