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sábado, maio 31, 2025

Outubro rosa, outubro cinza

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Outubro rosa, outubro cinza

Começou como campanha de conscientização contra o câncer de mama. Prédios públicos iluminados de rosa, lacinhos cor-de-rosa nas camisas.

Mas… estamos já em meados de outubro. Você não notou nada de diferente na capital? Não notou que a escuridão está invadindo os céus com pressa? Não percebeu que na fila do pão, depois do trabalho, fora da padaria já está escuro? Não viu que os parques e o comércio estão ficando sem luz cedo demais?

A verdade é que o outubro, que era para ser todo rosa, está meio cinzento. Nessa semana ou na próxima deveríamos estar adiantando nossos relógios em uma hora. Em lugar disso, estamos sendo envolvidos pela noite precoce.

Acusam esse governo de muitas coisas, mas se esquecem do essencial. O ano de 2019 marca o início do fim do horário de verão. Um fim de ano melancólico em preto e branco.

Daqui para frente, teremos outubros cinzentos, assim como novembros, dezembros e janeiros. Sem mais o crepúsculo rosa dos entardeceres de horário de verão.

Em outubro não temos o céu limpo de agosto, varrido e sem nuvens, que traz aquele “entardecer sem crepúsculo” como diz Euclides da Cunha sobre o interior brasileiro. Ao contrário, o décimo mês vem com as chuvas e com elas uma explosão de nuvens a marchar pelo céu, como montanhas no horizonte, como fumaça e gelo seco de um show do Rock in Rio.

Aqui, porém, o espetáculo é gratuito e sem filas. A luz dourada do poente incide sobre essas massas gasosas que passeiam pelo céu, ainda úmidas da última chuva, criando um cenário ora puro e tingido todo de rosa, como quarto de bebê, ora majestoso e ornado com pavilhões de púrpura, como o castelo de um rei.

Não sei a explicação para esse fenômeno, mas ao adiantar em uma hora o relógio ganhamos muito mais do que sessenta minutos de poente. O céu permanece nesse estado de enlevo pelo menos das cinco até às sete e meia. Isso é fato. O outubro é rosa.

O entardecer prolongado. O crepúsculo tardio. O pôr do sol que se demora.

Os antigos descreveriam como a quadriga de Apolo deixando o campo do céu em meio a um tapete de rosas. Vésper com seu manto anunciando graciosamente e chegada da noite. O crepúsculo com seus dedos rosas, na delicada fronteira entre o reino do dia e o reino da noite. A dança e o cântico das hespérides, que brincam no céu do entardecer e nos fazem sonhar com a afortunada ilha do ocidente. O discurso eloquente do firmamento sobre a glória de Deus.

Os modernos não veem mais beleza, não enxergam o esplendor dos céus, e desejam acabar com tradições. Arrancam-nos até a graça de termos poentes tardios e prolongados no fim do ano.

Se nada mudar, o único rosa que teremos em outubro será o das luzes artificiais a iluminar os prédios da cidade. Um outubro rosa um tanto quanto cinzento.

A natureza deseja participar novamente da campanha.

Rodrigo Bedritichuk é brasiliense, servidor público, pai de duas meninas e autor do livro de crônicas Não Ditos Populares

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