Impor limites é uma das formas mais sinceras de se amar — e, paradoxalmente, também de descobrir quem realmente nos ama. Muitas vezes confundimos afeto com conveniência, e é só quando ousamos dizer “não” que as máscaras caem. Como dizia o filósofo Friedrich Nietzsche, em Humano, Demasiado Humano (1878): “O amor é o estado no qual o homem vê as coisas mais diferentes de como elas são”. Essa frase revela como, em nome do amor, tendemos a aceitar o inaceitável, a ultrapassar nossos próprios limites e a tolerar o que nos fere — acreditando que isso é bondade, quando na verdade é medo de perder o outro.
Ao impor limites, você força a relação a se equilibrar entre o respeito e a verdade. O limite é um espelho: ele reflete se a pessoa está com você por quem você é, ou pelo que você oferece. Se, ao se posicionar, o outro se afasta, talvez nunca tenha sido amor, apenas utilidade. Erich Fromm, em A Arte de Amar (1956), escreveu que “o amor imaturo diz: amo-te porque preciso de ti; o amor maduro diz: preciso de ti porque te amo”. O limite é justamente o divisor entre esses dois amores.
Pense nas vezes em que você se desgastou tentando agradar. Cada concessão excessiva é como um empréstimo de energia sem juros de retorno. E o pior é que, quando você finalmente cobra o respeito que sempre deu, é visto como egoísta. Mas não é egoísmo, é sanidade. Os limites são a fronteira entre a doação e a autodestruição. Como ensinou a psicanalista Marie-France Hirigoyen em Assédio Moral (1998), “o respeito nasce onde o outro encontra resistência”. Ou seja, quando você se deixa pisar, ensina o outro a não te ver.
Na vida prática, isso se manifesta de formas sutis: o amigo que só liga quando precisa, o parceiro que exige compreensão mas nunca oferece, o chefe que se aproveita da sua boa vontade. Quando você começa a dizer “agora não”, “não posso” ou “isso me fere”, as intenções reais se revelam. Quem te ama de verdade se ajusta, busca compreender, tenta o equilíbrio. Quem só te usava, se irrita e se afasta. É simples e doloroso, mas libertador.
Dizer “não” é um ato espiritual. É afirmar diante da vida: “Eu também importo”. E, curiosamente, quem se ama mais passa a amar melhor. O autoconhecimento — esse velho mestre — ensina que não há amor que floresça em terreno sem limites. Aristóteles, em Ética a Nicômaco, já dizia que a virtude está no meio termo; nem submissão, nem rigidez, mas equilíbrio.
No fim, impor limites é um teste silencioso que separa o amor da conveniência. Quem permanece depois de ouvir seus “nãos” é quem realmente merece seus “sins”. Porque o amor verdadeiro não teme o limite — ele o respeita, o acolhe e o transforma em confiança.


