O Governo do Distrito Federal anunciou a extensão dos horários dos postos de saúde para atender às demandas da pediatria – que têm aumento nesta época do ano em decorrência das viroses respiratórias. Embora, à primeira vista, a medida possa parecer uma solução, não resolve o problema do déficit de médicos pediatras na rede pública de saúde.
Minha intenção não é criticar o que é uma solução para uma questão emergencial do presente. O que me preocupa é o que vem à frente, o futuro. Estender horários dos postos de saúde é só uma medida paliativa. É como enxugar gelo. A raiz do problema está na falta de contratação de médicos e de incentivos para ingresso e permanência no serviço público: condições de trabalho e salários favoráveis.
O servidor público da Saúde não pode pagar o pato pela falta de planejamento. Já imaginou se, de uma hora para outra, o seu chefe diz que, a partir de amanhã, você vai trabalhar até as 22h? Não dá pra ser assim, especialmente quando o principal interessado é a população. É preciso estratégia, planejamento e capacidade de administração.
A falta de pediatras na Secretaria de Saúde (e não no DF) é uma questão estrutural e complexa, que exige ações mais amplas e de longo prazo. A extensão dos horários dos postos de saúde não resolve a falta de recursos e equipamentos nessas unidades. E quando uma criança é encaminhada de lá para uma emergência de hospital, fica esperando todo o processo de classificação de risco e entra na (longa) fila de atendimento, como se já não tivesse sido encaminhada por estar em condição que merece atenção rápida.
Mais de 1.600 médicos pediatras atuam nas redes pública e privada do DF, mas na rede pública, apenas 467. O gargalo é grande. E, para solucioná-lo, estender horários (sem condições de trabalho e de assistência à população) não resolve.
Há muitos anos, luto por organização no serviço público de saúde do DF. Não tem planejamento. Não tem estratégia. As doenças sazonais da pediatria, enfatiso, não são novidade no calendário da saúde: aparecem todos os anos, no mesmo período, com a mesma frequência. Algo semelhante aconteceu na pandemia da covid-19. Teve a primeira onda na Europa, depois chegou aqui. Teve segunda onda lá…e aqui, no DF, deixamos o caos se instalar para tentar contê-lo com medidas paliativas e caras.
É exaustivo o papel de crítico quando se sabe que tem solução possível e real para os problemas. A população precisa de atendimento e a saúde é para todos – um direito que está na Constituição. Justamente por isso, é preciso olhar com cuidado para os profissionais que estão na ponta. Eles também adoecem. E deixá-los à beira de um colapso não é aceitável.
Houve um tempo (e não faz tanto assim) em que a saúde do DF era referência para todo o País. Sou, gosto de parafrasear Ariano Suassuna, um realista esperançoso. E é com os pés fincados no chão que tenho certeza: pode voltar a ser. Uma outra realidade para a saúde pública do Distrito Federal é possível. Mas, para acontecer, a palavra “planejamento” não pode ser esquecida.
Por: Dr. Gutemberg Fialho