Esse é o nosso grande erro: pensar que nos angustiamos pela morte que virá. A maior parte da morte já veio e já se foi. O tempo que passou pertence à morte. Há uma ilusão persistente, quase cínica, em crer que a morte é um evento futuro. Como se ela estivesse marcada no calendário, esperando sua hora, enquanto vivemos livres de sua presença. Mas a verdade mais aguda e inquietante é que a morte não é apenas aquilo que um dia virá — ela é tudo aquilo que já se foi.
Cada segundo desperdiçado, cada amor não vivido, cada gesto que calamos por medo, cada caminho que não tomamos por comodidade… tudo isso é morte em sua forma mais sutil e silenciosa. Não como o corte súbito de um fim, mas como uma erosão contínua do que poderíamos ter sido. A morte futura assusta, sim. Mas é a morte do passado — a parte da vida que perdemos por desatenção ou covardia — que mais nos condena.
Seneca nos alertava: “Não é que temos pouco tempo de vida, mas que desperdiçamos muito.” A morte já está em nós — nas manhãs em que esquecemos de agradecer, nas palavras que deixamos de dizer, nas ideias que não ousamos tirar da gaveta, nos silêncios onde deveríamos ter nos erguido. A cada noite que dormimos sem refletir, sem amar, sem decidir com coragem, uma parte de nós morre — e esse pedaço não volta mais.
Essa reflexão exige uma virada profunda na forma como vivemos o presente. Se o tempo passado já pertence à morte, então o tempo presente é tudo o que temos. E ele é fugaz, escorregadio, impiedosamente breve. A vida, portanto, não deve ser protegida da morte futura, mas resgatada da morte passada. Não se trata de adiar o fim, mas de impedir que a morte continue avançando em vida, disfarçada de distração, procrastinação e mediocridade.
Para o líder, essa consciência é urgente. Não basta alcançar metas e sustentar aparências. A pergunta real é: o que em você ainda está vivo? Quais ideias ainda pulsam? Quais relações ainda ardem? Quais decisões esperam por sua coragem? Um líder que vive apenas no ontem ou no amanhã é um morto que fala — e seu legado será o eco vazio de um nome que não soube se entregar ao agora.
Espiritualmente, essa é uma convocação para o despertar. Muitos buscam a iluminação como fuga da dor, mas ela é, antes, uma aceitação radical da realidade. E a realidade é esta: você já morreu muitas vezes. Em cada escolha que adiou, em cada verdade que negou, em cada momento que tratou como banal. Renascer espiritualmente não é repetir mantras ou seguir fórmulas: é reverter esse processo de morte lenta com presença intensa. É acordar para si mesmo como quem acorda de um coma existencial.
Emocionalmente, esse insight pode doer — mas cura. Cura porque nos liberta da ansiedade de querer controlar o fim. Cura porque nos chama de volta à vida que ainda pulsa, ao tempo que ainda resta. Cura porque nos confronta com a única pergunta que importa: como posso viver de modo que o hoje não pertença à morte, mas à eternidade?
Como ponto de decisão, esse pensamento exige ruptura. É tempo de revisar rotinas, relações, prioridades. É tempo de desenterrar paixões esquecidas, reconstruir pontes quebradas, parar de adiar o que já clama por nascimento. A vida não nos deve nada — somos nós que devemos a ela um sentido. Um propósito. Uma presença.
E por fim, deixo-lhe perguntas que não podem ser respondidas com pressa:
Quais partes de você já estão mortas — e você ainda não teve coragem de enterrar?
Que horas do seu dia pertencem à vida — e quais pertencem à morte?
O que você ainda não fez por medo de morrer, sem perceber que, ao adiar, você já está morrendo?
E se a única forma de vencer a morte fosse viver de modo que o tempo não se perdesse, mas se tornasse eterno?
Viva com sentido. Pense com profundidade. Decida com coragem. Suba com propósito.