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sábado, abril 20, 2024

O criminalista mais famoso do país é um poeta

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O criminalista mais famoso do país é um poeta

Kakay, Antônio Carlos de Almeida Castro, célebre advogado durante a Lava Jato, Mensalão, não é o Al Pacino, do filme “Advogado do Diabo”. Ele é o Gene Kelly que canta na chuva, na rua, na fazenda ou numa casinha de sapê. Foi defensor de poderosíssimos políticos, incluindo ex-presidentes da República com 99% de sucesso. Ganha nos tribunais. Ganha na vida com disposição. Já ganhou até concurso de canto no navio (aquele do Roberto Carlos). Bem relacionado, diz ter amizades antigas e não se permitir ficar ao lado de pessoas que o fazem mal. Acredita em Miguel Arcanjo. Renova as energias no mar. Faz uma fezinha, custa nada, afinal.

Como vai você?

Eu preciso saber da sua vida

Peça a alguém pra me contar sobre o seu dia

Anoiteceu e eu preciso só saber

Como vai você?”

(canção imortalizada por Roberto Carlos)

Por CAROLINA CASCÃO

Assim começou a nossa conversa. Um acorde de dó maior simples e sem desafinação. Como numa canção de Roberto Carlos, a descoberta do século: um dos homens mais poderosos do Direito Penal do País, Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, apelido batizado por ele mesmo, é dotado de uma sensibilidade impressionante. Exerce a empatia por onde passa. Diz-se gostar de gente. “Apaixono-me pelas pessoas”. Gosta de cantar, notadamente as canções de Roberto Carlos. É amigo do “Rei”, do qual foi advogado por causa de uma biografia não autorizada e hoje amigo. É amigo do ex-ministro José Dirceu. Declama poesias ao cair da tarde, diariamente, em sua mansão, no bairro Lago Sul, em Brasília. É gente como a gente. E como todo bom mineiro, emociona-se ao ver o mar.

Agora a parte que todos já sabem, mas não custa nada repetir: ele é o famoso advogado criminalista de celebridades, empresários e políticos. Políticos mesmo, tipo três Presidentes da República, José Sarney, Itamar Franco e Fernando Collor de Mello (atualmente também), um Vice, mais de 20 ministros, mais de 90 governadores e empresários famosos da Odebrecht, Andrade Gutierrez e por aí vai. Parlamentares envolvidos na Lava Jato e no Mensalão também estão no extenso currículo. Como ninguém é de ferro, beldades não ficam de fora de suas defesas técnicas, como a atriz Carolina Dieckmann. Afinal quem não tem colírio, usa óculos escuros. Kakay não precisa de nenhum dos dois.

A defesa técnica é o maior critério para Kakay aceitar o cliente. Se não tiver isso (nem ética), o advogado não segue em frente. “Só defendo se puder me entregar de maneira visceral. Faço uma análise e participo de tudo. Elaboro a tese e acredito nela”, revelou. Hoje, no escritório, localizado num shopping em Brasília, ele tem seis advogados intelectualizados, leves e de bem com a vida. “Gosto do que faço. E só discuto dentro dos tribunais”, afirmou.

Nos casos que atua, Kakay obtém 99% de sucesso, uma prova de que ele confia no processo. Perguntei a ele como é defender alguém culpado. “É preciso entender as razões. Em que circunstâncias aconteceram o crime? Se eu achar que foi crueldade, não vou advogar. A advocacia não serve para covardes”, explicou. Do contrário, ele garantirá o direito à ampla defesa e à presunção de inocência.

Quando vem a fragilidade, me ligam”, disse. Perguntei se ele tinha alguma fragilidade também. A resposta veio no mesmo segundo, uma prova de que não estava enganada: Kakay é humilde e contraria todo o pré “conceito” que havia construído sobre ele. A resposta foi angústia. “O mundo me angustia. As dores dos outros me angustia. Tenho dificuldades de viver num país tão desigual. Mas é a angústia que me impulsiona”, revelou. E logo emendou com uma frase de esperança com olhos verdes. “A vida deve ser levada a sério, mas não a sério demais. Entende?”, indagou. Entendo.

Ser feliz hoje em dia é uma afronta à sociedade. Posiciono-me no mundo”, emendou. Não sei o que quer dizer, mas em cima da mesa de trabalho, em sua biblioteca de casa, li uma placa com a frase “vida longa aos loucos”. Está cravada em madeira em caixa alta. Será preciso loucura, mais que coragem, para exercer o direito?!

Ele é contrário à prisão em casos de crimes financeiros. “Toma tudo o que o cara tem aqui, fora do país, tudo”, afirmou. De acordo com Kakay, o excesso de punitivismo tomou conta do Brasil, especialmente após a Lava Jato, momento em que a Justiça tenta colocar a sociedade contra aos que têm poder. “E assim as pessoas não percebem e vão perdendo os direitos sem notar. É como andar no setor comercial de dia e de repente vai escurecendo e não se percebe”, comparou.

Corona Vírus em presídios

A maldade e o descaso estão incrustados em boa parte da sociedade brasileira. Na quase totalidade da outra parte reina a indiferença. Ou seja, um muro de covardia e de obtusidade foi erguido para que não vejamos a tragédia dos presídios. Um invisível círculo de giz foi riscado para impedir que o cheiro dos presos alcance o lado de fora. E um ensurdecedor silêncio se faz envolto numa densa e opaca nuvem para não permitir que ouçamos os gritos alucinantes de socorro. Parece um livro de ficção. Haja criatividade para descrever uma realidade tão covarde e abjeta”. (palavras de Kakay)

Impressionado com a falta de empatia das pessoas, que segundo ele, são lúcidas e esclarecidas, ele falou sobre a relação dos “presídios e o Corona Vírus”. Ele revelou que 160 mil pessoas trabalham no sistema carcerário, direta e indiretamente, como advogados, médicos, pessoal da limpeza. E que estes poderiam sair de lá contaminados e transmitir para outros que nunca nem passaram perto de uma prisão. “Seria mais digno conter o vírus de dentro para fora. Ao proteger os presos, os trabalhadores diários de penitenciárias também estariam protegidos e quando terminassem a rotina e fossem para casa, a sociedade assim também estaria”, disse. As “pessoas esclarecidas”, segundo ele, só abriram os olhos frente ao problema quando perceberam que a disseminação poderia chegar perto delas. “Se o vírus permanecesse apenas nos presídios, elas nem atinariam para a questão”, desabafou.

Segundo ele, a dignidade do ser humano é a base do Direito Constitucional e Penal. “Quando a pessoa perde a liberdade perde a liberdade frente à vida, ele não perde os demais direitos inerentes à dignidade da pessoa humana. Tive pouquíssimos clientes que foram presos durante toda a minha vida profissional. A cadeia tem um clima específico, a situação precária carcerária brasileira vai contra a lei, até porque as leis foram escritas para humanizar. Deviam transformar cadeias em lugares mais dignos”, disse.

Você foi generoso com Brasília ou Brasília foi generosa com você?

Antônio Carlos de Almeida Castro é especialista em Direito Penal, formado pela Universidade de Brasília, em 1981. Nesta ocasião, como orador na cerimônia, usou 70% do discurso para falar sobre a situação em que vivem as pessoas nos presídios brasileiros. “O Direito é a forma de enfrentar os problemas do país e não resolver os problemas de saúde, educação etc”, disse.

Brasília não era a primeira opção de Kakay na época acadêmica. O Direito sim era a escolha certeira desde o começo. Queria ir para Belo Horizonte fazer a faculdade, mas não tinha a menor condição financeira -, foi sorte na opinião dele, pois Brasília é o melhor lugar para se viver e morar. Antes disso, aos 18 anos, morou em Goiânia, num período de muita alegria, embora o banheiro ficasse do lado de fora de casa. Veio para Brasília morar na casa de um tio. Começou a trabalhar no mesmo dia que começaram as aulas. Nunca esmoreceu. Prosperou e comprou este mesmo escritório aí, o mesmo que o acolheu sem nenhuma experiência.

Na capital do país, na época da Unb, ele fundou o Centro Acadêmico em plena ditadura militar. “Não tivemos aulas praticamente por um semestre por causa da greve. A universidade era direitista, numa política partidária. Eu queria uma política institucional”, afirmou.

Brasília foi generosa comigo. Fiz carreira profissional, grandes amizades e tive três filhos”, disse. Aqui, ele também foi proprietário do badaladíssimo Piantella, tradicional reduto de poderosos de Brasília, entre políticos e empresários patriarcas de famílias tradicionais. Lá, Kakay soltava a voz com Marcinho Silva ao piano. Entre os políticos, Ulysses Guimarães e Luís Eduardo Magalhães tinham mesas cativas. O ex-ministro José Dirceu (amigo de Kakay) costumava frequentar o segundo andar do restaurante, em sala reservada, para degustar vinhos com a cúpula do PT.

O Piantella, localizado na 202 sul, fechou as portas, após 40 anos de funcionamento, no mesmo dia em que Dilma Rousseff foi afastada definitivamente do cargo de presidente da República.

Atualmente, ele é proprietário do restaurante referência, em Brasília, chamado A Mano, na 411 sul. O estabelecimento oferece uma culinária sofisticada e especialidades italianas. Destaco as opções de vinhos que têm ótimo custo-benefício.

Kakay reabrirá em breve, o Piantas, todo ao estilo francês, na 403 Sul. Neste mesmo local funcionou o antigo Bistrô Expand.

Este renomado advogado casou-se três vezes “com mulheres muito interessantes”, segundo ele. Uma delas foi a filha do falecido senador Petrônio Portella, mãe de dois filhos dele, o arquiteto Cícero e o advogado Vinícius –, que embora tenha o mesmo bacharelado do pai, nunca exerceu. “Ele é escritor, especialista em literatura comparada”, disse com carinho.

Há 22 anos vive com a jornalista Valéria Vieira, amiga de infância e madrinha do primeiro casamento, mãe de Érico, de 15 anos. “Minha esposa é interessante: muito culta e tem uma visão do mundo ao qual me identifico. Ela é jornalista de culinária e morou no exterior por 12 anos, ministrando aulas de culinária. Ela tem livros publicados na Inglaterra, nos EUA, no Brasil ­por incrível que pareça, ela tem livros de culinária com 30 mil exemplares vendidos”, disse.

Infância e juventude em Patos de Minas

Kakay nasceu em Patos de Minas (MG) em 22/09/1957. Ama comemorar aniversários. De tantas festas, ele destaca os 50 anos com poesia. O convite foi um livro com 132 poesias. “Era para ser 50, mas não aguentei. Difícil dentre tantos textos lindos”, disse. Aos 60 anos, comemorou com uma festa em Portugal junto com a família e alguns convidados. Era para ser algo mais simples, mas ao final, 250 pessoas fizeram parte dos festejos. Ele conta que na ocasião, recebeu a ligação de um cliente e saiu correndo para o Brasil. “Era a chance de um julgamento. Cumpri a missão, depois voltei para a Europa”, disse.

Minha infância e adolescência foram boas, agradáveis. Sou de família grande com mais de 200 primos. Não tínhamos condições financeiras para viajar, então recebíamos muitas visitas. Fui conhecer o mar só aos 13 anos. E me apaixonei. Fiquei impressionado ao sobrevoar o mar pela primeira vez. Minas é bom, mas não tem praia”, disse.

Kakay gosta tanto do mar que tem um apartamento no Leblon, no Rio de Janeiro e uma casa em Trancoso, na Bahia. Outra grande paixão é a França. Em Paris tem um apartamento no distrito 6, no bairro Saint Germain, de frente ao Cafe de Flore, por onde passaram ilustres escritores em diferentes períodos, como Simone de Beauvoir e Jean-Paul Sartre. Mais uma prova da paixão de Kakay pela literatura e poesia.

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