Imagine um mundo onde a morte não existe e a vida é eterna. Nesse cenário, a noção de eternidade terrena pode parecer uma bênção. No entanto, a ausência da morte também poderia transformar radicalmente a maneira como entendemos a existência, a espiritualidade e a moralidade. Um dos aspectos mais intrigantes dessa ideia é a possibilidade de que, em um mundo onde todos são imortais, as religiões como as conhecemos talvez não tivessem motivo para existir.
As religiões têm desempenhado um papel central em quase todas as culturas humanas, fornecendo respostas para perguntas existenciais e oferecendo consolo diante da morte. A crença em uma vida após a morte, em um poder superior ou em um propósito divino tem sido uma âncora para a humanidade, proporcionando sentido e esperança. Mas, se a morte fosse eliminada da equação, qual seria a motivação para buscar respostas religiosas?
A religião, em muitos aspectos, surge da busca humana por significado diante da finitude. O filósofo alemão Arthur Schopenhauer afirmou que a consciência da morte é a “mola mestra” que nos impulsiona a buscar sentido e propósito. Ele via a morte como um motor filosófico, instigando o ser humano a questionar a vida e a existência. Se a morte fosse removida desse cenário, o que sobraria dessa inquietação existencial que tanto alimenta as religiões?
Além disso, muitas doutrinas religiosas oferecem uma promessa de eternidade, seja no paraíso, na reencarnação ou em algum outro estado transcendente. Mas se a imortalidade fosse uma realidade aqui na Terra, a busca por uma vida eterna após a morte perderia seu significado. As religiões que prometem salvação ou uma existência além do físico poderiam se tornar irrelevantes, já que a vida eterna seria um dado adquirido e não uma esperança futura.
No entanto, a imortalidade não eliminaria todos os dilemas existenciais. Mesmo em uma vida sem fim, as questões sobre propósito, felicidade, moralidade e o bem viver continuariam a existir. Em vez de desaparecer completamente, a religião poderia se transformar, mudando seu foco para essas outras dimensões da experiência humana. É possível que novas formas de espiritualidade surgissem, centradas em questões de ética, de crescimento espiritual contínuo e de harmonia com o universo. Essas novas religiões poderiam se concentrar em como viver bem por toda a eternidade, em vez de se preocupar com o que vem depois da morte.
Jesus Cristo, por exemplo, falou sobre a vida eterna, mas sempre em um contexto de renovação espiritual e moral. Em João 17:3, Ele diz: “E a vida eterna é esta: que te conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste.” Se a vida imortal fosse uma certeza, talvez o foco da religião se deslocasse ainda mais para essa dimensão de autoconhecimento e conexão com o divino no aqui e agora, e não apenas como uma preparação para o além.
Finalmente, devemos considerar que a imortalidade física não significa necessariamente a ausência de sofrimento, de angústia ou de crises. A dor, o amor, a perda, e outras emoções complexas ainda estariam presentes. Nesse contexto, a espiritualidade poderia continuar a oferecer consolo e orientação. Talvez as religiões se tornassem menos sobre o “depois” e mais sobre o “agora”, ajudando as pessoas a navegar pelas complexidades de uma vida sem fim.
Portanto, embora a imortalidade pudesse transformar profundamente o papel da religião, é improvável que eliminasse completamente a necessidade humana de espiritualidade e de busca por significado. A essência da religião, que é guiar o ser humano na jornada da existência, poderia apenas se adaptar a um novo entendimento da vida eterna, permanecendo um aspecto central da experiência humana.