A vida, segundo Gabriel García Márquez, não é mais do que uma contínua sucessão de oportunidades para sobreviver. Esta frase, à primeira vista crua, quase cínica, carrega em si uma verdade brutal: o mundo oferece poucas garantias e exige constante vigilância. Viver, nesse plano de entendimento, se transforma num esforço ininterrupto de manter-se em pé, de resistir ao caos, de não sucumbir. Mas será que sobreviver é tudo o que viemos fazer aqui?
Há uma linha tênue entre sobreviver e viver com propósito. A maioria se acomoda na zona da sobrevivência — acorda, trabalha, cumpre funções, apaga incêndios, corre atrás do próximo salário, do próximo prazer, da próxima distração. Cada dia parece uma batalha para manter-se minimamente funcional. Nesse modo, a alma adoece de escassez, a mente se encolhe e o espírito se cala.
A sobrevivência é o mínimo. É o instinto animal de preservação. Mas o ser humano, se deseja ser verdadeiramente humano, precisa transcender esse modo de operação. Só quando decidimos que a vida não será apenas algo a suportar, mas algo a construir, a expandir, a transformar — é que começamos, de fato, a viver.
Há líderes que sobrevivem nas empresas: mantêm os resultados, agradam os superiores, preservam seu cargo. Mas há líderes que vivem: criam, desafiam, inspiram, desconstroem o que não serve, plantam ideias novas. Estes fazem história. Aqueles apenas passam.
Há relacionamentos que sobrevivem: duas pessoas que não se suportam mais, mas que permanecem juntas por medo, comodismo ou conveniência. Mas há relações que vivem: onde há crescimento mútuo, verdade, atrito fértil, construção de algo maior que o ego de cada um.
Na comunicação, na arte, na fé — é a mesma diferença: sobreviver é repetir fórmulas, evitar riscos, obedecer ao script. Viver é ousar dizer o que importa, provocar sentidos, tocar o invisível.
Quando nos limitamos à sobrevivência, tornamo-nos reativos. Esperamos que a dor venha, que a crise nos desperte, que o limite nos obrigue a mudar. Perdemos o domínio da nossa narrativa e nos tornamos personagens secundários da nossa própria história. Vivemos esperando permissão, quando na verdade deveríamos estar assumindo missão.
Espiritualmente, a sobrevivência é o reino da mediocridade da alma. É a fé utilitária, que só se manifesta em pedidos desesperados, não em comunhão contínua. É a espiritualidade sem fogo, sem presença, sem entrega. Mas viver espiritualmente é outra coisa: é andar no fio da transcendência, é fazer escolhas com base no eterno, é ter consciência da própria morte sem ser escravo do medo. É viver como quem já sabe que tudo pode ser tirado — menos o sentido.
A mente que sobrevive é uma mente presa ao imediato. Busca atalhos, evita o desconforto do pensamento profundo, reproduz opiniões alheias. Já a mente que vive questiona, investiga, quebra certezas, dança com a complexidade. É a mente do filósofo, do criador, do estrategista.
Por isso, se a vida é uma sucessão de oportunidades para sobreviver, é nossa responsabilidade espiritual, ética e existencial elevar cada uma dessas oportunidades ao patamar da escolha consciente. Sobreviver é o começo. Viver é a obra.
Talvez a pergunta essencial seja: o que estou fazendo com as oportunidades que a vida me dá? Estou apenas resistindo, esperando a próxima crise, tentando não cair? Ou estou usando cada momento como chance de construção, de ruptura, de verdade?
Sobreviver nos mantém vivos. Mas é só vivendo com propósito que deixamos pegadas.
Perguntas para a elevação:
Em que áreas da sua vida você tem apenas sobrevivido, quando poderia estar vivendo com plenitude?
O que está esperando para iniciar o seu verdadeiro projeto de vida?
Quais medos o mantêm na zona segura da sobrevivência?
O que você precisa abandonar hoje para começar a viver com coragem amanhã?
Viva com sentido. Pense com profundidade. Decida com coragem. Suba com propósito.