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sexta-feira, maio 3, 2024

Coronavírus em Brasília

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Coronavírus em Brasília

Diziam que o brasiliense estava imune ao coronavírus, porque a propagação do vírus se dava por interação social. Diziam que não havia porque nos preocuparmos.

O começo se deu quando o avião da Força Aérea pousou em solo pátrio trazendo os brasileiros que vinham da China, em meados de fevereiro. Como previsto pelo governo, os brasileiros ficaram de quarentena em Anápolis.

Ninguém sabe como se deu ao certo. A hipótese mais provável é que tenha sido uma família voltando de Caldas Novas no domingo. Pararam para abastecer em Anápolis, apenas porque a mulher disse para o marido que a gasolina estava mais barata do que naqueles postos de Brasília que têm tudo o mesmo preço alto, que era aquele cartel que continuava dominando, e até porque ela ouvira que o dólar ia subir no dia seguinte e ia subir o preço nas refinarias e depois nas bombas… O marido, claro, parou para abastecer.

Ah, se soubessem o que significaria aquela abastecida… A família seguiu viagem e parou para comer no Jerivá. Além da moça do caixa, aquela parada infectou um grupo de três jovens amigos que estava atrás na fila. Agora, dois carros portando o vírus rumavam direto à capital.

Até ali eram umas cinco pessoas. O vírus morreria em uma semana. Talvez tudo ficasse certo se não tivessem inaugurado há pouco um restaurante novo na cidade. E brasiliense ama restaurante da moda. Colocar o nome na lista de espera, tirar foto do prato, mostrar aos amigos que já compareceu ao restaurante da moda. E lá foi um daqueles jovens frequentar o restaurante da moda numa quarta à noite.

Segundo estimativas, a partir daí o número de infectados subiu para uns quinze. Todos ainda assintomáticos. O número era baixo e poderia ter sido mantido sob controle. Mas passou a quinta, a sexta, e chegou o fim de semana. Um fim de semana chuvoso – sábado e domingo debaixo de chuva.

Para o brasiliense, não há outra coisa a fazer em um fim de semana chuvoso do que ir para o shopping. Foi então que o vírus se espalhou rapidamente.

Os sintomas começaram a aparecer, e talvez tudo ficasse certo se as pessoas infectadas fossem tratadas com presteza. Mas calhou de ser um fevereiro muito estranho, que ora fazia um calor de verão e ora chovia e ventava e fazia frio, de modo que ninguém sabia que roupa vestir adequadamente, e por isso muitos brasilienses griparam naquele mês. Portanto, a princípio muitos achavam que estavam apenas resfriados, quando na verdade o coronavírus já fazia estragos nos corpos de muitos candangos.

O alerta soou. Agora era oficial: o governo admitiu que muitos brasilienses estavam sim com o coronavírus. O pânico se instalou, e muitos tomaram atitudes desesperadas, como ir para o aeroporto e pegar o primeiro voo para fora da cidade. Mas qual o lugar mais provável para o brasiliense se encontrar com um conhecido do que no aeroporto?

Ali, além de não conseguirem embarcar, muitos candangos acabaram infectados. O vírus se alastrou ainda mais rapidamente.

O governo ficou desnorteado. Queria evitar a todo custo a propagação do vírus, impedindo os contatos sociais. Até emitiu um decreto dizendo que, a partir da data da publicação daquele ato, todos os dias seriam um domingo de janeiro, para ver se as ruas esvaziavam de vez.

Mas era tarde. Os médicos entraram de greve, o governo ameaçou instalar o ponto eletrônico, enquanto a Câmara discutia a situação jurídica do Hospital de Base.

A salvação veio quando, por um feliz acaso, cientistas descobriram que muitos brasilienses eram imunes ao novo vírus. Após análises de laboratório, descobriu-se que a imunidade estava garantida aos que haviam consumido alimentos em certo restaurante da rodoviária, não se sabe porquê.

O fato é que rapidamente a rodoviária se encheu como um formigueiro, com todo o quadrado candango se reunindo naquele ponto central para tomar a vacina, ou seja, comprar um combo com direito a refil de caldo de cana.

Felizmente, todos se recuperaram, e, tirada a histeria coletiva, a epidemia não passou de um caso mais abrangente de resfriado. E a vida voltou ao normal.

Rodrigo Bedritichuk é brasiliense, servidor público, pai de duas meninas e autor do livro de crônicas Não Ditos Populares

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