23.5 C
Brasília
quarta-feira, abril 24, 2024

Dhi Ribeiro: A voz da coragem

Date:

Share post:

Dhi Ribeiro: A voz da coragem

Por :  Samantha Fukuyoshi                                            
Fotos: Divulgação

Sozinha com a cara e muita sede de viver, batizada com o nome Edilza Rosa Ribeiro saiu de Salvador e veio para Brasília aos 27 anos tentar a sorte em um teste para a banda Trem das Cores no ano de 1994.

A proposta inicial era passar seis meses como cantora da banda, ela até retornou a Salvador, mas percebeu que tinha se apaixonado por Brasília e queria voltar. Aos poucos como nome artístico ela aderiu o apelido Dhi Ribeiro. “No começo da minha carreira, coloquei bastante Y e acento, mas no final o apelido Dhi prevaleceu. Deixei o H, para jamais esquecer de onde vim, da Bahia”.

 

Nascida no Rio de Janeiro em Nilopólis, ela se mudou aos 9 meses com a família para Salvador. Antes de seguir e criar raízes em Brasília, na capital soteropolitana morou nos bairros como Saúde, Liberdade, Mussurunga. Como tudo o que aconteceu em sua vida, a carreira de cantora também surgiu um pouco pela força do destino. “Eu era uma menina de periferia e agradeço a Deus ter sido criada em Salvador, porque traduz muito no meu trabalho, na minha formação como pessoa, principalmente como mulher negra. Salvador foi importante para inspirar o meu trabalho na música.

Ela se recorda com carinho da infância, o pai sempre gostou do carnaval, a mãe e a avó a levavam desde menina para ver as escolas de samba dos bairros, os blocos. “A minha família sempre teve uma relação grande com a música, meu avô, Herondino Ribeiro, é um os fundadores do bloco Filhos de Gandhy”. Conta ela se referindo a um dos tradicionais blocos baianos de afoaxé, fundado em 1949. O bloco formado por homens, até hoje desfila no carnaval em Salvador, se inspirou nos ideais de Não-violência e paz de Mahtama Gandhi. Em seu cortejo é comum que os integrantes distribuam colares azul e branco e borrifem a alfazema por onde passam. Nomes como Carlinhos Brown, Gilberto Gil estão entre os artistas que já conduziram a multidão em cima do trio elétrico junto com o grupo.   .

Como tudo começou

Antes de se apaixonar pelos palcos, Dhi Ribeiro foi modelo. “Eu iniciei a minha vida profissional aos 17 anos, nas passarelas por acaso”. Ela conta que foi só fazer companhia a amiga Delsa até a agência Girafa Produções. A amiga queria preencher um formulário para tentar ser chamada para um teste de modelo “O rapaz que nos atendeu perguntou se eu não queria uma ficha também. Eu respondi que não tinha condições de pagar o curso de modelagem. Ele me respondeu: só preenche, é de graça”.

Após 15 dias, o telefone toca, ela recebe um convite da agência para um teste de modelagem. Teste feito, a boa notícia: ela passou. Em seguida Dhi foi chamada para desfilar na 1ª Feira Nacional do Alto Verão de Salvador. “A princípio acreditei que era só para um dia, mas eu fiquei a semana toda desfilando para várias grifes famosas”.

Dhi ficou cerca de 10 anos no mundo da Moda, se tornou modelo nacional bem rápido. “Assim que eu entrei na carreira, me chamaram para fazer várias Semanas da Moda, a desfilar pela Beneton e outras marcas. Isso me deu uma base para ficar tranquila financeiramente e ajudar a minha família. Depois surgiu a música e no começo eu fui conciliando as duas coisas, mas cantar era muito mais por diversão”.

A trajetória profissional foi recordada quando ela participou do programa da Rede Globo, The Voice em 2017 por sua colega de passarela na adolescência e também da música, Ivete Sangalo.

Na ocasião a já conhecida cantora baiana falou: “Ela tem uma aparência familiar” e Dhi respondeu: “Tenho sim, nós desfilamos pela mesma agência”. Então, no palco do programa, elas relembraram de seus carreiras e eventos que participaram juntas.

Quando viu que a carreira musical tinha chance de funcionar, Dhi não pensou duas vezes e abandonou as passarelas pelos palcos e os microfones. “Sou grata por tudo o que aconteceu na minha vida, mas para a modelagem eu sinceramente só virei às costas. Um dia eu desfilava, no outro eu segui para a música e não voltei mais. Se aparece uma oportunidade e eu vejo que tenho condições, eu só vou, topo”, relata.

Sincretismo religioso

De família humilde, a artista relata que seus primeiros contatos musicais foram na igreja. “A musicalidade nós temos desde pequenos, apenas não percebemos”, explica. Ainda na infância ela participou de Coral da Igreja Católica, mas também tinha fortes referências da religião umbandista. “A minha vó era umbandista, mas naquele tempo ninguém dizia que era umbandista ou candomblecista, para os costumes da época tinha que ter educação católica”

A menina dividia seu tempo entre as missas de domingo e as obrigações às terças-feiras na sessão na casa da avó. “A igreja ficava em frente a casa de minha avó, então muitas pessoas praticavam, mas pouco se falava no assunto”, destaca.

A participação na igreja, dos grupos jovens a fizeram a aprender a tocar instrumentos musicais, a conviver com a música. “Aquela menina que andava com o violão embaixo do braço, eu não imaginava que se tornaria cantora”. Ela cogitou outras carreiras e até iniciou uma graduação em Salvador. “Eu pensava em ser médica ou historiadora. Medicina eu já vi que não era para mim, pois não me dava bem com sangue. Até fiz por um tempo a faculdade de Educação Física, mas na juventude eu não programava muito as coisas, eu deixava a vida me levar”.

Luta contra o câncer

Mesmo com uma alegria nata de viver, a artistas passou por dois momentos bem difíceis em sua história, mas que não retiraram sua fome de cantar. Em 2010, ela foi diagnosticada pela primeira vez com câncer no útero. “Eu retirei um tumor. Após 22 dias da cirurgia, eu já tinha compromisso no clube Ascade (Brasília) com o Jorge Aragão e o Diogo Nogueira em fazer uma homenagem ao aniversário da dona Ivone Lara”.

Dois anos depois, um novo tumor apareceu em seu corpo, desta vez, no estômago. “Eu fiz a cirurgia em janeiro, quando foi em fevereiro eu pedi para o médico não retirar os pontos. Por segurança, eu usei essas cintas modeladoras para manter o pique, pois eu me apresentaria no Carnaval em Salvador”.

 

Paixão por Brasília

Ela enxerga a música como “um agente modificador da minha vida”. Segundo a artista o preconceito por ser mulher e negra foi uma constante em sua vida. “Há muito preconceito, o velado e o descarado”, mas isso não a abalou. ”Eu saí das estatísticas de futuro comum para uma mulher negra e da favela, e virei de fato uma pessoa, dona do meu caminho”.

O que a atraiu para permanecer em Brasília foram as oportunidades que surgiram em sua trajetória musical. “Eu tive oportunidade de lidar com músicos de alto nível e isso me deu um estímulo para continuar a fazendo o que eu estava fazendo. Eu vi que podia me profissionalizar aqui e a cidade nos dá essas oportunidades”.

Ela conta da sensação de pertencimento quando vê Brasília da janela do avião. “Sabe quando você vê as luzes, a cidade de Sobradinho lá de cima, eu me sinto em casa”. Moradora do Guará, ela fala de seus hobbys favoritos. “Eu gosto de ouvir música no carro e passear pela Avenida das Nações, ou ir a feiras fazer compras. Quando a minha filha era pequena íamos muito ao Parque da Cidade, usava bastante o espaço das churrasqueiras. ”

Música como caminho

Como tudo o que ocorreu na vida de Dhi Ribeiro, com a música também não foi diferente. Ela relata que a convite de uma amiga foi ver o ensaio de uma banda de conhecidos. “Eu era muito tímida, tinha 21 anos. Cheguei e vi que era pessoas que tinham estudado comigo. Aí na brincadeira e atendendo a pedidos dos amigos, eu cantei”.

Como se fosse hoje ela se recorda da primeira música que cantou em um palco em 1988, chamada “A minha Pele de Ébano” consagrada pela voz de Margareth Menezes. Quando subiu no palco e se sentiu a vontade, não quis mais sair. Até que ela foi chamada para axé no trio elétrico, no Carnaval de Salvador. “Em 1993, eu fui cantora revelação do Carnaval quando sai com o bloco As Muquiranas” – Conhecido do público soteropolitano por reunir foliões com fantasias femininas.

Ela é conhecida por seu trabalho no samba, mas diz que é uma artista versátil. “Me rotularam como sambista, mas eu sou uma cantora que caminha por várias fontes de inspiração.”

Do prêmio de revelação, ela foi convidada para vir a Brasília trabalhar com a Banda Trem das Cores. “O convite era para ficar 6 meses, mas eu fiquei 1,5 ano, depois eu sai e fui arriscar outras coisas”. Tentou carreira solo, entrou nas bandas Companhia do Suingue, backvocal do Coisa Nossa e fui aprendendo muito nessa época.”

Antes de começar a carreira solo, em 2001, Dhi recebeu um convite para uma temporada no Circo Lídia Togni, na Itália. Já casada, ela foi antes e 11 meses depois o marido Tobias e a filha Luna Vitória, com 2 anos, foram para lá. “Eu trabalhava demais na Itália, a minha filha precisava estudar, eu vivia na estrada. Decidimos voltar para o Brasil. Se eu posso cantar lá, eu posso cantar em qualquer outro lugar também. Voltamos felizes para o País”.

Entre os músicos que ela cita com carinho, estão Evandro Barcellos (fundador do Clube do Choro), Emanoel Santos, Manga Vieira . “O Evandro me chamou para a primeira banda de samba aqui, alguns trabalham comigo na minha carreira solo, como o Manga, Valério Xavier, Fêlix Júnior, Adil Silva.

O convite para o seu primeiro CD aconteceu também de forma inesperada. Em 2007, Dhi foi chamada para substituir uma colega em uma apresentação no Restaurante Feitiço Mineiro na Asa Norte (DF). “O Jordy Gerson (CEO da gravadora Universal) estava lá e me assistiu, disse que queria fazer algo por mim. Um ano depois, o presidente e o diretor artístico da empresa também me assistiram e me chamaram para gravar um cd”.

A sua carreira musical foi apadrinhada por Jorge Aragão, Dhi já tocou com grandes nomes da música brasileira, como o padrinho musical, Diogo Nogueira, Leci Brandão, entre outros. Em 2009 foi lançado o primeiro disco “O Manual da Mulher”, a música “Aula de Matemática” fez parte da trilha da novela Tempos Modernos (2009).

E no mesmo álbum, a música de autoria de Paulinho Resende e Juninho Peralva e interpretada por Dhi, “Para Uso Exclusivo da Casa” se destacou em duas novelas. A primeira como trilha sonora da novela “Lado a Lado” (2012) com o casal Celinha (Isabela Garcia) e Guerra (Emílio de Mello) e a Força do Querer (2017) embalou o romance de Bibi Perigosa (Juliana Paes) e Rubinho (Emílio Dantas). Este último um convite especial da própria autora da novela, Glória Perez.

Projeção e novidades

.Além das músicas cantadas por ela integrarem as trilhas de novelas, a artista foi jurada do Programa Raul Gil, participou de programas como “Domingão do Faustão”, Jô Soares e programas de grande circulação. Ela se apresenta com frequência no continente africano, com passagens por Angola e Moçambique. “Lá as pessoas gostam muito da minha música”.

Desde o primeiro palco até hoje já se vão mais de 30 anos como cantora. Em tempos que os artistas optam por não investir mais em produzir CD´s, ela decidiu gravar o novo disco, que se chama “Leme da Libertação” e conta com 23 músicas, gravado no Clube do Choro. .

“Esse novo trabalho é um apanhado entre eles, temas como a mulher empoderada, a diáspora negra pelo mundo. Também canto alguns samba-enredos”. A artista explica que pretende lança-lo este ano, em data a ser definida.

LINK trilha sonora da novela Força do Querer: https://www.youtube.com/watch?v=7P0jYb8h570

 

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

publicidade

Related articles

Ronaldo Fonseca se filia ao PSD-DF

Ex-ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência do governo Michel Temer, o ex-deputado federal Ronaldo Fonseca filiou-se ao PSD nesta...

Cápsulas, pó ou gomas?  Dermatologista esclarece as principais dúvidas sobre a suplementação com colágeno

O nosso organismo produz colágeno de forma natural até por volta dos 25 anos de idade, após isso...

Projeto “Olha o palhaço, no meio da rua!” leva arte circense para praças e escolas públicas do DF

Serão seis apresentações gratuitas na Cidade Estrutural e em Brazlândia E raia o sol, suspende a lua... O Circo...

Curta-metragem vai mostrar como ditadura afetou crianças no Brasil

Em fase de busca de recursos, projeto já tirou o sono do idealizador Quando estava fazendo pesquisas para o...