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quinta-feira, abril 25, 2024

O 68 de LUÍS TURIBA

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Em recente estadia no Rio de Janeiro recebi do poeta Luis Turiba, o seu livro ‘Meiaoito: 68 razões de 68’ vencedor da Bolsa Literária Funarte de 2008, e editado em 2010 pela Coleção Oi Poema em Brasília.

O volume é dividido em três capítulos onde Turiba com sua poética ágil, coloquial, sonora, e, em vários momentos, bem humorada, nos confirma ser um dos principais nomes da Poesia Contemporânea Brasileira.

No primeiro capítulo, o ‘Cardiograma’, o autor toma o liricamente já tão desgastado ‘coração metafórico’, e apresenta um bloco temático, com vários poemas, mostrando que na sua escrita afinada o assunto pode ainda render surpresas.

“Tira gosto de poeta é coração” ele avisa logo de cara. E mais adiante confirma: “meu coração é rebelde, vive armando greve”. E revela até conselhos médicos: “o cardiologista dá as cartas, todo cuidado meu chapa, ou cê sinquadra ou infarta!”

O segundo capítulo é uma catarse intitulada ‘68’, com apresentação do poeta e jornalista Amneres, já anunciando o que virá neste longo poema onde Turiba, então com 18 anos de idade, revela o que viveu na pele e na alma naquele conturbado ano no Rio de Janeiro.

“Cantávamos palavras de ordem com a força máxima dos pulmões, último e único desejo de nossa jovem existência”, diz o texto que une tensão política, descobertas da juventude, brasilidade, sensualidade, Dylan, lisergia, samba, rock, Mangueira, Beatles, Marx, cachaça e coquetel Molotov, dentre outros ‘personagens’.

Nesta mistura emocional de referências e vivências o autor constrói um dos principais relatos já escritos, no calor dos acontecimentos, daquela época e geração.

Turiba descreve numa ascendente cadência as ‘primeiras experiências’ que, naquele ano, o marcaram radicalmente como: a pedra atirada, a passeata, o almoço no Calabouço, o filme de Godard, o jornal Classe Operária, o ‘ponto’ clandestino, a luta armada, a namorada libertária, amigos pirados, drogados e desaparecidos.

Esta sequência épica e alucinada nos faz lembrar, numa versão brasileira, o também caudaloso livro-poema ‘Uivo’ em que Allan Ginsberg narra os percalços e conquistas de sua geração Beat nos anos 1950 nos EUA.

O terceiro capítulo ‘Poemas Avulsos’ funciona como uma descompressão para o turbilhão anterior, iniciando com textos sobre Minas Gerais onde é dito: “atravessar Minas é surfar pelas páginas ímpares de Guimarães Rosa”.

Os outros focos desta seção são múltiplos: ‘oração para nossa senhora da bala perdida’, ‘o (biquíni) fio dental’, o ‘antropologuês’ que tira um sarro com intelectuais de fala difícil, o ‘papo de repórter’, o ‘fogão de lenha’, dentre outros. Alguns artistas são homenageados como Oscar Niemeyer, Jorge Mautner e Carlos Drummond de Andrade.

No final do livro, num poema em homenagem aos poetas Paulo Leminski e Nicolas Behr o autor sugere que aqueles que escrevem poesia: “são alquimistas do ofício, tratam seus artefatos como seres viventes em total dialética gramatical, letras espiram, palavras sangram…”

Este ‘68’, com significativo projeto gráfico do Reza, é um dos vários livros de poesia escritos por Turiba, que é também jornalista, editor e figura central no grupo fundador da revista de poesia experimental BRIC à BRAC.

Esta revista entre meados dos anos 1980 e 1990, foi, e ainda é, uma referencia para a arte poética brasileira e internacional. Em 2022 a BRIC, sob coordenação de Turiba, lança um número especial celebrando o centenário da Semana de Arte Moderna, da qual participei da equipe editorial juntamente com Luca Andrade e Romulo Garcias.

Joao Diniz, fevereiro 2023

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