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sábado, abril 20, 2024

O alívio depois do caos

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Ópera de câmera Happy Hour lembra a pandemia, mas passa mensagem de união e esperança. Espetáculo tem direção de Marcus Mota e é estrelado por Janette Dornellas

Um dos momentos mais angustiantes e tristes dos últimos tempos sob um olhar lírico e até esperançoso. A ópera de câmera Happy Hour, composta e dirigida por Marcus Mota, estreia dia 6 de junho, no Sesc Silvio Barbato, com recursos vindos do Fundo de Apoio à Cultura do GDF (FAC). O elenco tem as sopranos Janette Dornellas e Sophia Dornellas e a mezzo soprano Clara Figueiroa, além de uma orquestra formada de 9 mulheres.

Marcus conta que a ideia do espetáculo surgiu em meados de 2020, quando ele enfrentava a pandemia em Portugal. “Estava em Lisboa durante o início da pandemia. Era flagrante o descompasso entre o enfrentamento da covid no Brasil e em Portugal. Quando a situação melhorou em Lisboa, em meados de 2020, voltei para o Brasil, e fui caindo em um inferno sem fim. Havia já combinado com a Janette Dornellas um espetáculo centrado em mulheres maduras, profissionais, fora de seus papéis habituais de esposas, mães e filhas. Diante do caos na condução da pandemia no Brasil, parti para juntar as duas coisas: uma catarse pós-vacina e a forte presença de mulheres fortes durante a pandemia”, explica.

No palco, o público acompanha três amigas que se conheceram em ensaios de corais e fizeram parte do Coro Sinfônico da Universidade de Brasília: uma médica, uma empresária e uma professora, interpretadas respectivamente por Janette, Clara e Sophia. “A que nos introduz no mundo da pandemia é a médica, cansada de um cotidiano de tentar vencer a morte que se alastra.  Depois entram as amigas: a empresária, que luta para manter seu comércio diante do fechamento de tantas lojas; e a surpreendente volta da professora, que vendo as notícias do caos sanitário no Brasil, resolve voltar. Elas se reencontram e cantam a esperança e a união”, adianta o diretor. 

Janette Dornellas define a personagem que interpreta como “uma mulher que está vendo o sofrimento e a morte cotidianamente que chega do hospital em casa e só quer esquecer o horror que está vivendo”, mas destaca queHappy Hour não é um espetáculo pessimista, pra baixo. “A ideia do Marcus foi exatamente a da importância da família e dos amigos naquele momento. E foi assim que me senti na pandemia. As pessoas ajudaram muito para que a Casa da Cultura Brasília, meu pequeno teatro, não fechasse na pandemia. Então, é sobre solidariedade, amizade, cuidado”, completa.

Por isso, não é de se estranhar o título do espetáculo. A expressão Happy Hour nos leva a um momento feliz, de descontração. “O título é um chamariz, um gancho: lembra de algo que na normalidade pré-pandemia se relacionava com os encontros entre as pessoas depois do trabalho. Esses encontros, com o distanciamento social, viraram memória de um tempo feliz. No pós-pandemia, voltar a nos reunir era uma demonstração de apoio mútuo, de trocas de afetos, indignações. Happy Hour é mais sobre essa vontade de estar juntos depois que houve tanta desgraça. É voltar das sombras. A peça é pra frente : vai da dor da pandemia para a superação. Mas sempre nos alerta para ficarmos vigilantes contra as consequências de equívocos que poderiam ser evitados”, reflete Marcus Mota.

Marcus Mota é professor no Departamento de Artes Cênicas da Universidade de Brasília desde 1996 e trouxe esse universo para Happy Hour a partir da escolha de montar uma ópera de câmara, que tem uma estrutura mais enxuta do que uma ópera como estamos acostumados a imaginar. “Nos últimos anos, houve uma intensificação da composição de obras com elencos e conjuntos instrumentais reduzidos além de encenações mais econômicas. Com isso, há mais espaço para experimentações, exploração de possibilidades muitas vezes não presentes em obras de maior investimento. E muitas dessas novas óperas de câmera vêm do contexto universitário, como exercícios de reflexão e criação de novos repertórios”, explica.

Com menos cantores e músicos no palco e “menor ostentação visual”, o caminho fica aberto para  a intimidade, seja cênica, seja do olhar do público.  “Tratei de simplificar as linhas melódicas vocais e incrementar o trabalho com a orquestração, criando sonoridades, jogos e imagens acústicas que não se vinculavam a um segundo plano frente ao canto. As mulheres ocupam o palco, mas da orquestra irrompem sons outros, inusitados, que se lançam em mil direções”, afirma o compositor, que lançou mão de ritmos como frevo e maracatu em momentos “de maior vivacidade, esperança e alegria. Dançar, cantar juntas torna as protagonistas da ópera mais fortes, mais unidas.”

Força feminina

Essa união delas traz à tona o outro tema de Happy Hour. A ópera já foi pensada, desde o primeiro momento, para ser um momento de celebração do feminino. “Estamos numa época de resgate do papel da mulher como figura importante em todas as áreas. Eu tenho uma pesquisa sobre mulheres compositoras brasileiras de todos os tempos esquecidas pela história. Então, é maravilhoso ter um grupo de artistas mulheres tão talentosas trabalhando juntas. Há uma cumplicidade e um afeto muito presente o tempo todo”, comemora Janette Dornellas.

Esse não é o único motivo de comemoração da soprano. Janette divide o palco com a filha, Sophia Dornellas, pela primeira vez numa ópera. A mãe-coruja ressalta que Sophia, formada como atriz na Casa das Artes de Laranjeiras e bacharel em canto lírico pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, é “extremamente profissional” e que “quando estamos no palco somos colegas”. Mas Janette não esconde: “Existe, sim, uma admiração muito grande da minha parte, por ter uma filha tão talentosa.”

Happy Hour é um espetáculo de celebração, de agradecimento, apesar das dores e despedidas. “Todo mundo teve suas perdas. No intervalo de poucos meses perdi meu pai e meu amigo e mestre Hugo Rodas. Um me deu a vida, outro me fez nascer várias e várias vezes no teatro. Hugo, já com câncer, pegou covid no início de 2022, o que acelerou sua partida”, lembra Marcus Mota. “Os teatros fechados estão abrindo. Os artistas estão de volta. O público agradece. Essa é uma dramaturgia musical gerada em Brasília, com artistas de Brasília, tendo em cena imagens de lugares e memórias do DF. Obras dramático-musicais têm todo um apelo, pois envolvem e empregam profissionais de diversas linguagens. Diante de um mundo plural, diversificado, nada mais próximo que uma obra plural, múltipla”, finaliza o diretor.

SERVIÇO

Happy Hour

Ópera de câmera com texto e música de Marcus Mota

Data: 6 e 7 de junho, terça e quarta

Horário: às 20h

Local: Sesc Silvio Barbato (SCS Ed. Presidente Dutra)

Entrada franca

Livre para todos os públicos

Haverá audiodescrição e legenda para deficientes visuais e auditivos

Haverá palestra antes das apresentações e debate após

Informações para a imprensa: TÁTIKA Comunicação e Produção/ Kátia Turra: 61 99224-7294 @tatikaturra

Ficha técnica

Direção: Marcus Mota

Elenco: Janette, Dornellas, Sophia Dornellas e Clara Figueiroa

Cenário e figurino: Janette Dornellas

Iluminação: Lemar Rezende

Direção de vídeo: Carol Resende

Pianista: Gisele Pires

Maestro: Rafael Ribeiro

Marcus Mota

Marcus Mota é professor no Departamento de Artes Cênicas da Universidade de Brasília desde 1996, onde fundou e dirige o Laboratório de Dramaturgia (LADI-UnB) desde 1998. Integra o Núcleo de Estudos Clássicos da UnB, e é docente dos programas de pós-graduação em Metafísica e Artes Cênicas da UnB. Além disso, é escritor, dramaturgo e compositor. Fundou e dirige a revista Dramaturgias, que publica textos desde 2016. Entre diversos espetáculos, assinou Docenovembro (2001) Iago (2004), Ópera Hip-Hop (2009, vencedor do Prêmio Nacional de Expressões Afro-Brasileiras) e  Momaba (2011, ganhador do prêmio Klauss Vianna). 

Janette Dornellas

Doutora em Artes pela UnB, sob orientação de Marcus Mota, formada em Canto pela UnB, Mestre em Música pela Universidade de Goiás e Licenciatura em Música pela Universidade Católica. Cantou, no Brasil, um repertório lírico que inclui Vitellia (La Clemenza de Tito), Santuzza (Cavalleria Rusticana), Terceira Norna (O Crepúsculo dos Deuses), Leonora (Fidelio) e Lady Macbeth (Macbeth), entre outros. Estrelou recitais de música de câmera e concertos sinfônicos sob a regência de maestros como Claudio Santoro, Emílio de César, Silvio Barbato, Claudio Cohen, Rodolfo Fischer (Chile) e Ira Levin (EUA). Janette já se apresentou em outros países como Bolívia, Congo e EUA, onde viveu Carmem ao lado da Townsend Opera Player. Além de cantora, Janette é professora de canto, produtora, diretora e figurinista. Ela ainda mantém o Instituto Cultural Janette Dornellas, conhecido como Casa da Cultura Brasília.

Sophia Dornellas

De família de cantores, Sophia Dornellas iniciou a vida na música muito cedo. Formou-se em teatro pela Casa das Artes de Laranjeiras em 2015 e é bacharel em Canto pela UFRJ. Interpretou Susanna em As Bodas de Fígaro(2018),  Zerlina de Don Giovanni (2019), papel que também a levou, em 2022, a estrear nos palcos do Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Em agosto, deve ir para os Estados Unidos, onde fará mestrado em Performance na Universidade do Alabama. 

Clara Figueiroa

Mezzo-soprano com carreira marcada por atuações em repertório concertista e operístico como as óperas Cavalleria RusticanaThe Médium e  Gianni Schicchi. Destaca-se também na produção de espetáculos de ópera e concertos.

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